Tenho de sacar beats do youtube!
“Eu tenho de sacar beats do Youtube. Quando não há dinheiro para investir em beats, uma pessoa safa-se como pode, né?”
Compreendo a afirmação mas não concordo com ela.
Experimenta fazer um instrumental – se nunca fizeste um beat – tira uma tarde para fazer um. Soa igual aos beats da NET? Não? Então é preciso dar valor ao beatmaker que os faz.
Por este mundo fora há imensos beatmakers talentosos que perdem dias a escolher sons, a aprender a melhor forma de os usar, misturar, etc. Alem de investir tempo, há um investimento em hardware, sample packs e software. Saca uma demo do Reason/FL Studio/Ableton Live/Logic e tenta fazer um instrumental que soe como os que sacas da NET ou como os que os teus artistas preferidos usam. Rapidamente vais perceber que uma semana não te vai chegar para conhecer o software quanto mais programar drums, escolher sons, ter ideias para melodias, ritmos etc.
É preciso dar valor aos beatmakers.
Não tens orçamento para comprar um exclusivo ou um track-out lease, compra o wav sem tags, só aí já é uma diferença considerável em termos de qualidade. Porque é aí que quero chegar. É aqui que me diz respeito e que me deixa um pouco transtornado.
Existe uma diferença entre misturar beats por pistas e misturar um 2 track (2 track é um instrumental em stereo, ou seja, duas pistas). Misturar implica moldar o beat à voz e vice-versa, tendo o beat por pistas eu tenho esse trabalho facilitado e tu ficas com um tema a soar melhor – pelo menos eu quero acreditar que sim.
Vou tentar deixar aqui um exemplo de como é o processo:
Temos um instrumental com um sintetizador que está a ocupar o mesmo espectro de frequências que a voz. Se tiver só o 2 track, não tenho como descer o volume do sintetizador, nem tenho como equalizá-lo sozinho. O que vou tentar fazer é equalizar aquela zona das frequências no beat, vamos dizer que é entre 1kHz e os 3kHz, vou criar ali uma covinha para a voz furar melhor mas sem estar muito presente. Ao fazer isto acabei de cortar frequências na tarola/clap e ela já não bate da mesma forma. O beat acabou de perder energia e não é isso que eu quero para este tema, anulo o que fiz. Vou à voz, subo um pouco, talvez equalize um pouco para “jogar” bem com o beat e… tenho que me dar por satisfeito. Caso tivesse o beat por pistas ia à pista do sintetizador, descia o volume e/ou equalizava e estava o assunto resolvido.
Ao ouvir novamente o tema sinto que o bombo e o bass/808 podiam bater com mais energia mas, não tendo o beat por pistas, se calhar nem faço nada para não estragar. Se tiver o beat por pistas posso equalizar e mudar volumes à vontade ou talvez dar mais destaque a um do que o outro.
Em termos de arranjos, posso tirar a parte melódica na entrada do segundo verso e entrar só os drums e 808. Se tiver só o 2 track a única opção que tenho é fazer silêncios ou recriar o beat com samples que tenha à mão. Na minha opinião isso é uma afronta para o produtor, caso ele ouça e se aperceba que outra pessoa alterou o instrumental. Eu não ia gostar que mexessem num beat meu sem permissão.
O verso da moeda
Vou me contradizer em relação à primeira frase deste artigo. Eu compreendo que numa fase inicial não queiram gastar dinheiro em instrumentais, porque não estão a fazer dinheiro com a música e se calhar não é importante – nem viável – esse investimento logo à partida. Se a tua ideia é melhorar o skill, há beats que os produtores disponibilizam gratuitamente, uma pesquisa rápida no google ou no youtube por “free beat” dá-te logo uma lista enorme por onde escolher. Outra opção passa por procurar e conhecer produtores da tua zona, juntarem-se e fazerem um tema ou um EP, crescerem os dois como músicos e poderem apresentar um trabalho com cabeça, tronco e membros. Mas assim que reservares tempo num estúdio porque queres dar um level up ao teu trabalho, porque tens brio nos temas que queres entregar, aposta em instrumentais comprados – de preferência por pistas. Acho que qualquer técnico de som de norte a sul te vai agradecer e os beatmakers sentem-se valorizados.